Autismo e Vida Independente: Por que Ainda Falamos Tão Pouco Sobre a Autonomia de Jovens Autistas?

Falar sobre autismo muitas vezes ainda é sinônimo de pensar na infância. Há avanços — sim, muitos — no diagnóstico precoce, nas terapias infantis, na inclusão escolar. Mas e depois? O que acontece quando aquele menino ou menina autista se torna adolescente, depois jovem adulto, e começa a desejar o que todos desejam: autonomia, independência, liberdade?
A verdade é que a sociedade ainda não está preparada para responder a essa pergunta.
A vida independente para pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma realidade possível — mas apenas para quem tem acesso, oportunidade e, principalmente, apoio. Não basta desejar a independência, é preciso construí-la. E isso exige ação coordenada de famílias, educadores, profissionais de saúde e, claro, do poder público.
Mais do que habilidades, precisamos de caminhos
Fala-se muito em ensinar habilidades práticas para jovens autistas: cuidar da própria higiene, organizar sua rotina, pegar transporte, administrar o próprio dinheiro. E, de fato, essas competências são fundamentais. Mas de que adianta ensinar tudo isso se, ao sair de casa, o jovem encontra um mundo que ainda o trata como alguém incapaz?
A sociedade cobra autonomia, mas não oferece os caminhos. Os jovens autistas querem — e podem — viver com mais liberdade. Mas falta o básico: inclusão no mercado de trabalho, espaços acessíveis, moradias assistidas, programas de apoio contínuo. O discurso da independência não pode estar dissociado de políticas reais.
Famílias entre o medo e a esperança
Para as famílias, a transição para a vida adulta de um filho autista é, muitas vezes, um momento de angústia. Há o medo do despreparo, o receio da violência, o receio do abandono. E essa insegurança é compreensível — afinal, muitos desses jovens acabam voltando à estaca zero justamente por falta de suporte externo.
Mas não podemos esquecer que a autonomia começa dentro de casa. Pais e mães precisam de apoio psicológico e orientação para deixar que seus filhos avancem, mesmo que aos poucos, no caminho da independência. O excesso de proteção, ainda que com boas intenções, pode ser uma armadilha silenciosa.
O papel do Estado: de coadjuvante a protagonista
É inadmissível que, em 2025, o Brasil ainda não tenha políticas públicas robustas voltadas à vida adulta de pessoas autistas. Falta tudo: programas de capacitação profissional, incentivos à inclusão no trabalho, moradias assistidas com supervisão leve, redes de atendimento psicológico, centros de convivência. Onde estão esses direitos? Onde estão essas estruturas?
Esperar que cada família resolva isso sozinha é cruel. Inclusão real exige investimento, planejamento e vontade política. Já passou da hora de tirar a pauta do papel e colocá-la no orçamento público.
Autonomia é direito, não privilégio
A ideia de que só alguns autistas podem ser independentes é ultrapassada. Todos, em seus diferentes níveis de suporte, podem conquistar algum grau de autonomia — desde que recebam apoio adequado. A independência não é sinônimo de total isolamento, mas de protagonismo na própria vida.
É hora de mudar o olhar. Chega de tratar a vida adulta de pessoas autistas como um capítulo esquecido. Precisamos falar mais, planejar melhor e agir agora. Porque autonomia, para qualquer ser humano, é sinônimo de dignidade. E dignidade, como sabemos, não pode ser seletiva.
Gi Ferro – Viver Autismo
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